Poesias

No lugar de onde eu vim

No lugar de onde eu vim,
se fruía o instante que passava
e os outros, sem olhar para trás.

No lugar de onde eu vim,
sorria-se com pés descalços
debaixo das chuvas e o gosto de lágrimas.

No lugar de onde eu vim,
se eu queria, Deus concordava
e o sol nascia todos os dias no coração.

No lugar de onde eu vim,
a linguagem não era só de palavras,
mas de emoções despetaladas à flor da alma.

No lugar de onde eu vim,
tudo o que se dizia falava de mim,
e os outros em ti éramos todos nós.

No lugar de onde eu vim,
não se aprendia a ser feliz, eu era
a felicidade pousada no flanco esquerdo do anjo

No lugar de onde eu vim
se dava valor de ouro às pinturas
que os dedos faziam nas curvas de um seio.

No lugar de onde eu vim,
quando se proibia as alegrias que vinham como enxames,
eu tirava dos alforjes as astúcias da imaginação.

No lugar de onde eu vim,
se ouvia no sótão da casa as algazarras dos anjos,
das crianças e dos fantasmas que celebravam esta outra vida.

No lugar de onde eu vim,
eu era inocente e dos pecados originais
só conhecia os rubores vaginais e o balanço das tranças.

No lugar de onde eu vim,
não se resistia a quem abria as saias
floreadas e nos mostrava a pérola do dia.

No lugar de onde eu vim,
se dividia todas as coisas em partes
desiguais para a gula dos mais ávidos.

No lugar para onde eu vou,
dizei-me, oh tempo que resta dessa imorredoura paixão
que tudo será igual ao lugar de onde eu vim.


09/03/2010

 

 

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